Vendedor que vira gerente perde direito a horas extras? 6c3z49
O TST julgou um caso envolvendo horas extras de um vendedor promovido a gerente, invalidando a tese da empresa por falta do aumento salarial mínimo de 40% exigido por lei. A decisão reforça a proteção ao trabalhador e limita práticas abusivas nas relações de trabalho.
Recentemente, um julgamento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) envolvendo uma grande varejista brasileira e um ex-empregado na função de vendedor trouxe destaque a um questionamento relacionado à existência das horas extras nos cargos de gerência. 3m6n5x
Antes de tudo, é importante entender que a caracterização de um cargo de gerente para fins de exclusão do regime de horas extras está prevista no artigo 62, inciso II, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ao olharmos para o desfecho do caso em questão, entendemos que é necessário haver critérios rigorosos para a supressão de direitos trabalhistas. Isto reforça a importância da segurança jurídica nas relações de emprego.
A controvérsia do caso estava na alegação da empresa de que o empregado, ao ser promovido ao cargo de gerente, estaria automaticamente excluído do direito a horas extras com base no artigo 62, II, da CLT. No entanto, conforme o entendimento do TST, a caracterização desse enquadramento exige comprovação de que o trabalhador receba remuneração superior em pelo menos 40% ao seu salário-base anterior. Ficou demonstrado neste caso concreto que, mesmo após a promoção, o aumento salarial não atingiu esse patamar. Portanto, foi invalidada completamente a tese proposta pela empresa.
Com essa decisão, um princípio básico do Direito do Trabalho se fez presente: a presunção de proteção ao empregado. O reconhecimento da necessidade do aumento de pelo menos 40% no salário para a caracterização do cargo de confiança protege os trabalhadores de rebaixamentos disfarçados de promoções. Sem essa garantia, empresas poderiam utilizar a nomenclatura de "gerente" para contornar a CLT e todas as suas normas de jornada de trabalho. No fim das contas, como na maioria das vezes, o único prejudicado é o trabalhador.
Outro aspecto importante da decisão foi a reafirmação do entendimento do TST quanto à impossibilidade de reexame de provas nesta instância superior, conforme a Súmula 126. Esse princípio impede que empresas utilizem recursos que deixem o processo ainda mais demorado para ter mais chances de reverter decisões que já foram amplamente analisadas em instâncias anteriores, garantindo maior celeridade e previsibilidade ao processo trabalhista.
O caso desta grande varejista brasileira não é isolado. Sabemos que muitas empresas hoje buscam enquadrar trabalhadores na função de vendedor ou propagandista em cargos de confiança sem qualquer aumento salarial, configurando uma prática abusiva. Essa decisão do TST serve tanto para empregadores e trabalhadores ficarem por dentro dos limites legais da flexibilização de jornada. A legislação trabalhista não deve ser usada para criar atalhos que favorecem apenas um dos lados da relação de trabalho.
Por fim, aqui vemos uma jurisprudência que aponta para um mercado de trabalho mais justo e equilibrado, que não desfavoreça o lado mais fraco. É um princípio básico do Direito do Trabalho o fato de haver uma assimetria de poder entre o empregador e seus colaboradores. Desse modo, as empresas devem compreender que o reconhecimento profissional necessita vir acompanhado de compensação salarial adequada e não de aumento de responsabilidades sem o devido reconhecimento financeiro.
(*) Airton Rafael Bier é advogado trabalhista e sócio do escritório Bier Mello Advogados.